Bocejo do Bruxo
Há quase dez anos, terminado
o sonho hippie, a voz do antropólogo Carlos Castaneda foi como uma massagem
revitalizante nas cabeças fatigadas por drogas, à beira da incerteza dos anos
70. Os ensinamentos do velho índio yaqui Don Juan pareciam acenar com a
possibilidade de uma outra viagem, menos feérica talvez que as lisérgicas, mas
igualmente estimulante na maneira como tentava interpretar os diversos níveis
da realidade, nas páginas de A Erva do
Diabo.
Guru transitório de uma
geração demasiado volúvel (ou apenas desesperada?) na forma como troca rápida e
sofregamente de ídolos, nos livros posteriores Castaneda não cumpriu as
expectativas. Os claros ensinamentos de Don Juan, curiosamente impregnados da
simplicidade complexa do zen-budismo, complicaram-se ao infinito.
Como filósofo, ou no mínimo
porta-voz do filósofo Don Juan, Castaneda tornou-se decepcionante. E, como
contador de histórias, incorreu num pecado mortal: a chatice indisfarçável.
Infelizmente, O Presente da Águia não foge à regra.
Declarando-se muito distante do seu ponto de origem como homem de padrão ocidental
ou mesmo como antropólogo, Castaneda faz questão de esclarecer que “este
trabalho não é uma ficção”. Não sendo ficção, nem antropologia, nem filosofia,
torna-se difícil e monótono acompanhar as confusas andanças do autor em
companhia de outros nove aprendizes de feiticeiro. Os iniciados, quem sabe,
talvez encontrem algum prazer, mas quem estiver em busca de qualquer coisa
aplicável ao mísero cotidiano dificilmente escapará a um melancólico sentimento
de frustração. Ou a um sonoro bocejo de puro tédio.
Veja, 21 de Outubro de 1981
Nenhum comentário:
Postar um comentário