Outra matéria da POP, “a primeira revista para
jovens do Brasil” que a editora Abril lançara em novembro de 1972. No fim dos
anos 70, Caio Fernando Abreu era redator lá e é bem nessa época que
começa Para Sempre Teu, Caio F., o livro que Paula Dip escreveu sobre ele.
“Caio tinha muitos anos de estrada: integrou a primeira equipe de jornalistas
da revista Veja, tinha vários livros publicados e premiados, havia morado na
Europa. Ainda não assinava Caio F. e escrevia os contos de Morangos Mofados”,
escreve Paula. “cabelos ralos, quase pretos, longos e escorridos, olhos
indianos gigantescos, úmidos e de pupilas boiando e que olhavam com tristeza os
telhados trágicos da rua do Curtume, na Lapa de baixo (nota: o endereço da
redação)”, descreve no livro Carlos Alberto Fernandes, que era diretor da Pop.
Sonhos
O mundo onde a gente vive sem censura
Uma velha lenda
chinesa conta que, uma vez, um homem sonhou que era uma borboleta. O sonho foi
tão completo e tão cheio de detalhes que, ao acordar, ele ficou numa dúvida
terrível: não sabia mais se era um homem que tinha sonhado que era uma borboleta
ou se era uma borboleta sonhando que era um homem.
Claro que isso é
só uma lenda. Mas o que ela quer dizer é que a realidade de um sonho não é “menos
real” do que aquilo que “acontece de verdade”. O sonho é a realidade do
insconsciente, ou uma mensagem que o inconsciente, em forma de símbolo, envia
para o consciente. Para Freud, o pai da psicanálise, o consciente está para o inconsciente
assim como a superfície de um iceberg está para a sua parte submersa. Parece
complicado, mas ficará mais fácil se você imaginar uma daquelas enormes
montanhas de gelo flutuante. Pois aquele pedaço visível do iceberg é apenas um
décimo do seu tamanho total: nove décimos ficam sob a água. Assim é o
inconsciente, ou a parte desconhecida de nós mesmos; incrivelmente maior que a
parte consciente.
O que acontece quando o inconsciente fica “dono da
jogada
O inconsciente (ou id) não dorme nunca. Quando você está dormindo, o que adormece são a sua parte consciente (o ego) e o supergo (aquela parte “repressiva” da sua personalidade). Durante o sonho, então, o inconsciente é que fica “dono da jogada”, sem nenhuma barreira do ego ou superego. E os recados que ele envia, ou as historinhas que ele “inventa”, são a expressão daquilo que você realmente é, mas fica escondido quando você está acordado. Portanto, o sonho é como um retrato da parte oculta da própria pessoa que sonha. Reflete aquilo que você é realmente. Cada objeto ou personagem do sonho é uma criação do sonhador, e são bobagens muito grandes aquelas histórias de que, por exemplo, sonhar com “cobra, quer dizer traição”. Esses significados gerais não existem. O que é preciso saber é como você sonha com determinadas coisas, e o que elas significam dentro da sua vida. O que um sonho quer dizer é profundamente pessoal. Os artistas, principalmente os pintores, muitas vezes criam suas obras a partir de seus sonhos. Existem casos de cientistas que, depois de terem passado horas acordados, tentando resolver algum problema complicado, encontraram a solução num sonho. Os índios pigmeus costumam se reunir todas as manhãs, para que cada um conte o seu sonho. Depois, eles tiram uma interpretação que sirva para os sonhos de todos, e programam as atividades do dia de acordo com isso. Todas essas pessoas sabem da importância do inconsciente. O inconsciente “sabe” de tudo, guardou tudo – desde aquela lição da História que você aprendeu, no segundo ano primário até a mágoa de uma sacudidela mais forte que sua mãe lhe deu quando você ainda era um bebê. Isto é: o insconsciente é, em parte, um depósito de medos e frustrações. Mas é principalmente aquilo que você é.
O inconsciente (ou id) não dorme nunca. Quando você está dormindo, o que adormece são a sua parte consciente (o ego) e o supergo (aquela parte “repressiva” da sua personalidade). Durante o sonho, então, o inconsciente é que fica “dono da jogada”, sem nenhuma barreira do ego ou superego. E os recados que ele envia, ou as historinhas que ele “inventa”, são a expressão daquilo que você realmente é, mas fica escondido quando você está acordado. Portanto, o sonho é como um retrato da parte oculta da própria pessoa que sonha. Reflete aquilo que você é realmente. Cada objeto ou personagem do sonho é uma criação do sonhador, e são bobagens muito grandes aquelas histórias de que, por exemplo, sonhar com “cobra, quer dizer traição”. Esses significados gerais não existem. O que é preciso saber é como você sonha com determinadas coisas, e o que elas significam dentro da sua vida. O que um sonho quer dizer é profundamente pessoal. Os artistas, principalmente os pintores, muitas vezes criam suas obras a partir de seus sonhos. Existem casos de cientistas que, depois de terem passado horas acordados, tentando resolver algum problema complicado, encontraram a solução num sonho. Os índios pigmeus costumam se reunir todas as manhãs, para que cada um conte o seu sonho. Depois, eles tiram uma interpretação que sirva para os sonhos de todos, e programam as atividades do dia de acordo com isso. Todas essas pessoas sabem da importância do inconsciente. O inconsciente “sabe” de tudo, guardou tudo – desde aquela lição da História que você aprendeu, no segundo ano primário até a mágoa de uma sacudidela mais forte que sua mãe lhe deu quando você ainda era um bebê. Isto é: o insconsciente é, em parte, um depósito de medos e frustrações. Mas é principalmente aquilo que você é.
O sonho: aquele momento escondido entre o fundo e a
superfície
O sonho acontece num mundo momento especial do sono, que passa por três fases distintas. Na primeira, também chamada de pré-sono, o organismo ainda está ligado à realidade consciente. Aos poucos, a temparatura vai baixando, as batidas do coração diminuem, vem um relaxamento profundo, um repouso total: é o sono propriamente dito. Várias vezes, durante a noite, o corpo começa a “voltar”. Nos momentos entre os sonos superficial e profundo, os olhos, fechados, se movimentam rapidamente – é quando acontece o sonho. Os olhos acompanham as imagens, como se você estivesse acordado e vendo tudo. O sonho se dá, portanto, na passagem do sono superficial para o profundo, e vice-versa.
O sonho acontece num mundo momento especial do sono, que passa por três fases distintas. Na primeira, também chamada de pré-sono, o organismo ainda está ligado à realidade consciente. Aos poucos, a temparatura vai baixando, as batidas do coração diminuem, vem um relaxamento profundo, um repouso total: é o sono propriamente dito. Várias vezes, durante a noite, o corpo começa a “voltar”. Nos momentos entre os sonos superficial e profundo, os olhos, fechados, se movimentam rapidamente – é quando acontece o sonho. Os olhos acompanham as imagens, como se você estivesse acordado e vendo tudo. O sonho se dá, portanto, na passagem do sono superficial para o profundo, e vice-versa.
Muita gente diz
que não sonha, mas está provado que todo mundo sonha, todas as noites. Algumas
experiências feitas, acordando um homem sempre que seus olhos começavam a se
mover durante o sono, provaram que, se ficar 48 horas sem sonhar, uma pessoa
começa a ter alucinações durante seu estado de vigília, podendo até
enlouquecer. Mas lembrar ou não do sonho depende de muitos fatores, inclusive
da sua própria disposição para esquecer. Porque existem coisas que você sente e
o seu consciente se recusa a aceitar.
Parece incrível: passamos dormindo quase um terço da
nossa vida
Se você despertar no momento da passagem do sono superficial para o sono profundo, ou vice-versa, será mais fácil lembrar do sonho. Mas não é só isso. É claro que, se você se levantar imediatamente depois de acordar, tomar café e sair correndo, vai ser muito mais difícil lembrar do que se você ficar algum tempo ainda na cama, tentando “puxar” o sonho. Um bom método é ter sempre um caderno e uma caneta na cabeceira: mesmo que você anote alguma palavra ou faça um desenho qualquer, mais tarde isso poderá fazer você acordar e entender o sonho. Por que fazer isso? Ora, passamos quase um terço da nossa vida dormindo. Os sonhos, então, são nossa vida noturna, secreta e profunda. Quanto mais você lembrar seus sonhos, mais você estará conhecendo a si mesmo – e existe coisa melhor? Outra coisa que faz com que a gente tenha dificuldade de lembrar é a autocensura. Aí acontece um negócio estranho: quando você está sonhando, não há censura de espécie alguma, o inconsciente está completamente livre. Então você pode sonhar as coisas mais loucas: que está tendo relações sexuais com um desconhecido, por exemplo, ou que está matando seu melhor amigo. Ao acordar, a censura volta imediatamente a funcionar. E se o sonho foi muito “forte”, ela não vai permitir que você lembre. É justamente por isso que a grande maioria dos sonhos parece confusa ou absurda. Além da linguagem do inconsciente ser quase desconhecida para nós, as defesas do ego e superego fazem tudo para parecer ainda mais complicado. A educação que a gente recebeu, a moral da família, todas aquelas divisões que colocaram na nossa cabeça, do que é “bom” ou “mau”, de como se deve ou não agir – tudo isso atua sobre nosso comportamento. Na verdade, só somos completamente livres no inconsciente e, quanto mais ele for conhecido , mais completamente saberemos quem somos . Por isso a psicanálise dá tanta importância ao mundo dos sonhos.
Se você despertar no momento da passagem do sono superficial para o sono profundo, ou vice-versa, será mais fácil lembrar do sonho. Mas não é só isso. É claro que, se você se levantar imediatamente depois de acordar, tomar café e sair correndo, vai ser muito mais difícil lembrar do que se você ficar algum tempo ainda na cama, tentando “puxar” o sonho. Um bom método é ter sempre um caderno e uma caneta na cabeceira: mesmo que você anote alguma palavra ou faça um desenho qualquer, mais tarde isso poderá fazer você acordar e entender o sonho. Por que fazer isso? Ora, passamos quase um terço da nossa vida dormindo. Os sonhos, então, são nossa vida noturna, secreta e profunda. Quanto mais você lembrar seus sonhos, mais você estará conhecendo a si mesmo – e existe coisa melhor? Outra coisa que faz com que a gente tenha dificuldade de lembrar é a autocensura. Aí acontece um negócio estranho: quando você está sonhando, não há censura de espécie alguma, o inconsciente está completamente livre. Então você pode sonhar as coisas mais loucas: que está tendo relações sexuais com um desconhecido, por exemplo, ou que está matando seu melhor amigo. Ao acordar, a censura volta imediatamente a funcionar. E se o sonho foi muito “forte”, ela não vai permitir que você lembre. É justamente por isso que a grande maioria dos sonhos parece confusa ou absurda. Além da linguagem do inconsciente ser quase desconhecida para nós, as defesas do ego e superego fazem tudo para parecer ainda mais complicado. A educação que a gente recebeu, a moral da família, todas aquelas divisões que colocaram na nossa cabeça, do que é “bom” ou “mau”, de como se deve ou não agir – tudo isso atua sobre nosso comportamento. Na verdade, só somos completamente livres no inconsciente e, quanto mais ele for conhecido , mais completamente saberemos quem somos . Por isso a psicanálise dá tanta importância ao mundo dos sonhos.
A única possibilidade de conhecer a nossa face oculta
Para Sigmund Freud, o sonho revelava sempre desejos reprimidos, frustrações, culpas, medos ocultos. Mas para outros psicanalistas importantes, como Carl Gustav Jung, os sonhos têm também outros sentidos – podem até ser premonitórios, isto é, falar de alguma coisa que vai acontecer na realidade, antes que aconteça. Na linha da Gestalt-terapia, descoberta por Frederick Pearls, o sonho expressa principalmente situações de vida que não foram resolvidas. Sonhos que se repetem muito, especialmente pesadelos, seriam um problema à espera de solução. Todos os sonhos são pequenos fragmentos de nossa personalidade, e até mesmo sua expressão mais espontânea. Na Gestalt-terapia, existe um truquezinho para entender melhor os sonhos: o psiquiatra pede à pessoa que conte o sonho no presente, como se ele estivesse acontecendo. Então, ao invés de dizer, por exemplo:
Para Sigmund Freud, o sonho revelava sempre desejos reprimidos, frustrações, culpas, medos ocultos. Mas para outros psicanalistas importantes, como Carl Gustav Jung, os sonhos têm também outros sentidos – podem até ser premonitórios, isto é, falar de alguma coisa que vai acontecer na realidade, antes que aconteça. Na linha da Gestalt-terapia, descoberta por Frederick Pearls, o sonho expressa principalmente situações de vida que não foram resolvidas. Sonhos que se repetem muito, especialmente pesadelos, seriam um problema à espera de solução. Todos os sonhos são pequenos fragmentos de nossa personalidade, e até mesmo sua expressão mais espontânea. Na Gestalt-terapia, existe um truquezinho para entender melhor os sonhos: o psiquiatra pede à pessoa que conte o sonho no presente, como se ele estivesse acontecendo. Então, ao invés de dizer, por exemplo:
“Eu sonhei que
estava num barco”, você diz: “Estou num barco”. E é importante que você tente
se sentir não apenas você mesmo, naquela situação, mas também o barco, a água e
todos os detalhes do sonho, um por um. Cada elemento é um pedacinho de você.
Pearls diz que o sonho jamais é confuso ou absurdo enquanto estamos dentro
dele. Mesmo que você sonhe que está voando, isto vai parecer tão natural quanto
caminhar. Na Gestalp-terapia, o teatro não está no sonho. Ele está aqui, na
atividade diária, onde representamos um papel que, às vezes, não sabemos qual
é. E podemos concluir, paradoxalmente, que é exatamente quando estamos
acordados que nos encontramos “dormindo”. Frequentemente, você não entende
porque começa a ter pesadelos num momento da sua vida em que parece tudo correr
bem. O que acontece, então, é que durante o dia você “finge” perfeitamente que
tudo está ótimo – e a verdade só vem à tona à noite, sob a forma de sonho. É a
verdade mais profunda, que, embora você disfarce, encontra sempre uma maneira
de aparecer. Pode parecer esquisito, mas aquela pessoa que diz que não dá a
mínima para os sonhos, que prefere se preocupar com a realidade, na verdade
sabem muito pouco de si mesma. Quanto mais você prestar atenção a esses recados
que o inconsciente envia, mais ficará consciente de quem realmente você é. Isso
é o mais fascinante do reino dos sonhos: a possibilidade de conhecer a nossa
face oculta.
Revista Pop, 1978
pretty nice blog, following :)
ResponderExcluirComo espiritualista que sou vejo tudo de forma diferente, ja que sonhos podem ser lembranças de um tempo passado, cuja existência vai nos sendo revelada, mas acho muito inteligente a forma em que abordou o assunto, continue e meus parabéns pelo tema...abraço...Anjopoesia
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