Sobre Loucos e Sãos
“Cada
coisa é, na realidade, uma alucinação, cada coisa é pó, cada coisa é uma flor
maravilhosa no céu” – diz Ronald D. Laing logo nas primeiras páginas deste
livro (Sobre Loucos e Sãos), provando que seu pensamento, longe da rigidez teórica, cada vez mais se
aproxima do discurso filosófico e literário. Apontando Albert Camus, Sartre e
Kafka como fundamentais na sua formação, ele compara seus métodos de abordagem
psiquiátrica aos de um romancista, quando assume “uma perspectiva sobre uma
multiplicidade de perspectivas”. Talvez por isso estes textos possam ser lidos
como se fossem uma obra poética.
Aos
53 anos, o criador da antipsiquiatria, alçado à condição quase de guru durante
os anos 70, nessa série de entrevistas concedidas ao psicólogo italiano Vicenzo
Caretti, discorre com o mesmo brilhantismo sobre temas como a filosofia zen, as
viagens lisérgicas, os destinos da família, a condição da mulher, a
esquizofrenia ou o amor. Seja qual for o assunto, sua preocupação básica é
sempre com os seres humanos, pois o “essencial”, afirma, “é o que acontece
entre as pessoas”.
Insurgindo-se
contra a psiquiatria tradicional, punitiva e repressora, ele propõe novo
caminho, onde exista uma emoção mais forte entre o analista e o analisado. Ao
lado das mulheres, dos jovens, dos ecólogos, dos “loucos”, luta à sua maneira
por uma revolução no interior dos indivíduos, “em direção a uma situação em que
cada um se comporte melhor em relação aos outros”.
Culto,
mas sem erudições inúteis, remete-se constantemente à filosofia oriental, à
mitologia grega e à literatura contemporânea para ilustrar suas teorias. Lúcido
sem ser pessimista, avisa aos que o consideram mais um profeta do apocalipse,
cético e amargo: “Espero na segunda, na quinta e no domingo, e me desespero na
terça e no sábado. Algumas vezes, tenho fé, outras não. Mas certamente não perdi
nem a fé nem a esperança”. Como todos aqueles que, apesar das muitas provas em
contrário, ainda acreditam na dignidade da condição humana”
Veja,
27 de maio, 1981
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