Lucia Peterle: |
Foi Gilberto Braga quem me viciou em telenovela. E Adalgisa Colombo quem me
viciou em concurso de miss. Mas o que tem a ver? Bem, outro dia as duas coisas
se juntaram num capítulo de Anos
Dourados. Durante um chá, Tania Scher comentava que a recém-eleita Miss
Botafogo levava muito jeito de conquistar o Miss Distrito Federal. Era de
Adalgisa que ela falava. Delícia! Vocês podem até duvidar, mas me formei no
ginásio com uma Miss Mundo. Uma futura Miss Mundo, claro. Naquele tempo, nos
interiores brabos do Rio Grande do Sul, Lucia Peterle não passava de uma moça
alta demais para seus 15 anos, com um pé enorme e aparelho nos dentes. Mudou-se
para o Rio, virou Miss Guanabara, terceira Miss Brasil e Miss Mundo, em 1971.
Sentava perto de mim, era ótima aluna e –
como éramos os dois compridíssimos – dançávamos muito twist. Mas antes de
Lucia, eu já curtia o Miss Brasil. Começava a chegar junho, meu pai trazia toda
tarde o Diário de Notícias e, às
sextas, O Cruzeiro. Chegado o dia,
tinha permissão para ficar na sala ouvindo o concurso pelo rádio – um rádio
enorme, do tamanho de uma mesa. Frio de rachar, eu com um caderninho, anotando
as medidas das moças e as minhas candidatas. Quase sempre acertava. Minha mãe
tinha estranhas opiniões: achava
Adalgisa, por exemplo, muito solta. Ela gostava de Teresinha Morango, com seu
ar de “família”. Concordávamos com Marta Rocha: luxo. Só que eu de repente caía
em fixações malucas: enlouqueci por Denise da Rocha Almeida. Desclassificada no
Miss Guanabara 63, voltou enxutérrima em 64, concorrendo por Brasília. Perdeu
para Ieda Maria Vargas. Gaúcha, naturalmente. Denise deu escândalo, ameaçou
impugnar o resultado. Garotinho, eu já tinha um fraco por bandidas... Dizem
agora que o concurso perdeu a graça. Fico pensando coisas. Primeiro, que um
certo tipo de feminismo tira muito o prazer da gente: que mal faz moça bonita? E será que não foi a
TV quem roubou muito daquela graça? Mil vezes mais estimulante você ouvir pelo
rádio e imaginar, só imaginar. Ou será que tudo não perdeu um pouco a graça
nestes tempos de Chernobyl? Quanto a mim, continuo achando miss um grande
barato. Dá a ilusão de que tudo se recompõe, e tudo volta a ser meio ingênuo. E
bonito. Hoje à noite vou estar outra vez firme, torcendo pela linda gaúcha
Deise.
OESP – Caderno 2, Sábado, 17 de maio de 1986
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